Já por
aqui tinha referido a apetência pelos países da ex-união soviética por modelos de máquinas de barbear manufaturados no ocidente. Esta ilação pode ser rebuscada e a verdade é que não existem evidências que este seria o caso.
A Golf, marca Germânica do início do seculo 20, mercê da conjuntura geopolítica do pós-guerra deixou uma fábrica bem por detrás da cortina de ferro, mais propriamente na cidade de Leipzig, em pleno funcionamento.
Desta fábrica saíram uma serie de máquinas. A mais apetecida talvez seja a Golf ASAN. Eu reservo o fascínio para a Golf 71
Estas máquinas acabam por invariavelmente partilhar uma construção frágil, com materiais menos nobres e apresentando resultados longe das suas irmãs ocidentais. No entanto impõe-se uma certa tolerância na apreciação das mesmas. E se é certo que a ex URSS era uma potência, não será segredo para ninguém que, muito do que se fez, foi com recurso a uma boa dose de improvisação e desenrascanço. E é aqui, neste último factor que reside o meu fascínio ou não fosse o desenrascanço tão português quanto os cantos de Camões.
Nitidamente inspirada na GEM Contour, trouxe o conceito de Single Edge para um mercado onde não havia produção de lâminas SE. Em comum o Flip Top e o push Button, como mais-valia o facto de utilizar lâminas DE. Infelizmente as semelhanças ficam-se por aí.
O cabo nervurado é de plástico, tendo no inferior a inscrição da marca “Golf” e na parte superior “spannen” e “öffnen”. Pesa apenas 31 grs contra as 45 da GEM.
A tampa abre-se empurrando o botão para cima, para fechar basta empurrar para baixo.
A lâmina prende bem, e se alguma duvida houvesse neste aspecto a verdade é que não se manifesta aqui quaisquer inconvenientes. Se analisarmos bem, o angulo da lâmina desde o seu centro para o lado exposto é muito semelhante á da EJDE89 por exemplo, sendo que o GAP na Golf 71 é menor. O escanhoado é rente, agradavelmente muito audível e bastante suave.
Durante o barbear e uma vez que já referi que este é tranquilo o choque fica reservado para o seu aspecto. Esta é a máquina menos estilizada das que possuo e, se uma Valet ou Ronson têm um cabeçal monstruoso, dignos adereços de uma novela steampunk a verdade é que na Golf fica-se com a sensação que este não está acabado. Um excesso de linhas rectas e ausência de curvas cria uma sensação de profundidade muito grande que ofende a vista.
É uma maquina conceptual é verdade mas com uma total ausência de preocupação estética. A sensação que fica é que nos estamos a barbear com uma peça industrial. Pode-se sempre argumentar que prevalece a função á forma e aí sim ela cumpre.
Ao contrário da GEM que transmite robustez, a GOLF 71 parece frágil. Tão frágil que, cada vez que fechamos a tampa não sabemos se será a ultima vez. Se todo aquele obscuro mecanismo de plástico e chapa não dará de si deixando-nos com os resquícios de algo que já se assemelhou a uma maquina DE. Mas a beleza é que coisa, á boa maneira Russa, lá vai funcionado.
Em suma, poderia perfeitamente ter saído da garagem de um carola qualquer em São Domingos de Rana. É tão naïf quanto isso. Não concorre com a GEM Contour. Nunca o poderia fazer em pé de igualdade ou não fosse esta ultima o fruto de décadas de evolução somente a pensar na lâmina da mesma marca.
Mas não deixa de ser uma máquina divertida de se usar e que o deve de ser num contexto histórico.
Cada vez que a uso lembro-me dos relatos dos astronautas Americanos que participaram no programa Shuttle-Mir sobre os procedimentos dos homólogos Russos.
Para mim espelha um modo de vida que á época se escondia de nós por detrás da cortina de ferro. Foi feita numa fabrica que fazia maquinas DE convencionais, não havia uma necessidade logica de fabricar uma maquina com um mecanismo frágil que só usasse um dos gumes da lamina. Talvez fosse uma afirmação de que podiam fazer tudo o que os outros faziam, embora fatalmente limitados pelos fracos recursos disponíveis.
Recomendo a quem goste de maquinas insólitas. Irá cumprir dignamente o proposto com o seu quê de iconoclasta.
